Seu cérebro tem um truque infalível pra você gastar sem culpa… e ele usa todo dia 1l4t2w


Por Evandro Canello 703g6a

22/04/2025 11h17 - Atualizado em 22/04/2025 11h26 366625





Já tentou dirigir um carro que puxa para o acostamento o tempo todo? Não é culpa sua, mas se não segurar firme o volante, acaba na vala… e aí o problema vira responsabilidade sua. Com os seus hábitos de consumo acontece o mesmo: o cérebro quer prazer agora e zero esforço depois. Sair da rota segura não é erro, é quase um “defeito de fábrica”. 272c2s

Um instinto automático, herdado lá dos tempos em que sobreviver era prioridade. Mas hoje, quem decide continuar no controle é você.

Falar é fácil. Difícil mesmo é segurar o dedo do Pix e dizer “não” ao prazer imediato. E não, isso não é papo de coach nem filosofia de bar. É o que você sente na pele toda vez que adia um sonho porque o “agora” parecia mais urgente.

E o que fazer para desarmar essa armadilha? O primeiro o é entender como o cérebro funciona: esse mestre da persuasão, com seus 1,5 kg, é especialista em te convencer a fazer o que não devia. Ele te influencia a gastar mais do que pode, adiar investimentos e empurrar a reserva financeira para o clássico “mês que vem”. Mesmo sabendo o que é certo, a gente escolhe o caminho mais fácil: o agora.

Obviamente, existe uma explicação científica para esse comportamento. Em 1961, o psicólogo Richard Herrnstein observou um padrão curioso em testes com pombos e ratos: eles preferiam recompensas menores e imediatas, mesmo quando havia a opção de esperar um pouco mais por algo melhor.

Ou seja, nem os bichos escapam da tentação do “agora”. Anos depois, na década de 1970, George Ainslie aprofundou essa linha de pensamento e mostrou que o comportamento também se aplicava a nós, humanos, com a mesma previsibilidade.

Ele deu o nome de desconto hiperbólico a essa armadilha. O termo soa técnico, mas o conceito é direto: a tendência de valorizar mais uma recompensa imediata do que uma futura, mesmo quando a futura é objetivamente melhor. Mas por que “hiperbólico”?

Ainslie usou esse termo porque percebeu que o valor que atribuímos ao tempo não diminui de forma linear ou previsível, como propunha a teoria econômica clássica com o conceito de desconto exponencial.

Na prática, ocorre uma distorção: quanto mais próxima está a recompensa, maior é o valor emocional atribuído a ela.

À medida que essa recompensa se afasta no tempo, o interesse por ela cai de forma abrupta, e não gradual, como se imaginava. Essa curva de desvalorização acentuada foi descrita matematicamente como uma curva hiperbólica. Veja:



Em outras palavras: o cérebro distorce o tempo e quase sempre favorece o agora mesmo que isso custe o amanhã.

Décadas depois, o economista comportamental David Laibson aplicou essa teoria à economia real. Em 1997, ele introduziu o conceito de quasi-hyperbolic discounting (desconto quase hiperbólico) para explicar por que as pessoas economizam menos do que gostariam, ou por que muitas vezes planejam investir “amanhã” mas raramente cumprem esse plano.

A raiz desse comportamento está nos atalhos que o cérebro usa para aliviar desconfortos do presente. Quando somados à rotina, eles formam um padrão: gastos impulsivos, adiamento de planos e uma habilidade impressionante de enrolar a própria vida financeira com argumentos quase convincentes.

Ansiedade disfarçada de oportunidade

O fenômeno do desconto hiperbólico, por si só, já atrapalha bastante. Mas nos últimos anos ele ganhou um reforço de peso: o efeito Fomo — Fear of Missing Out, ou medo de estar perdendo algo.

O termo, cunhado pelo pesquisador Dan Herman no fim dos anos 1990, descreve a ansiedade gerada pela sensação de exclusão diante de oportunidades ou experiências. Mais tarde, o Fomo foi popularizado por Patrick McGinnis, que o disseminou em um artigo de 2004 na Harvard Business School Magazine.

Essa ansiedade social, alimentada em tempo real pelas redes, intensifica o impulso por decisões imediatas, mesmo quando elas claramente jogam contra o planejamento.

O medo de “ficar de fora” virou um motor silencioso para decisões apressadas. É o que faz alguém parcelar em 12 vezes algo que nem queria tanto, só porque “só vai até hoje”. Ou investir no que não entende só porque o feed virou uma liquidação de promessas irresistíveis.

Cientificamente, o Fomo ativa as mesmas áreas do cérebro ligadas à dor e ao sistema de recompensa. Traduzindo: não participar é desconfortável de verdade. E é aí que o consumo vira um analgésico emocional.

A armadilha não está só no que se compra, mas na razão por trás da compra: não parecer por fora, não ficar atrás, não ser o único da roda que não entrou “naquela oportunidade imperdível”. O presente deixa de ser apenas desejado, vira inadiável. O futuro, coitado, vai sendo empurrado com cada “semana que vem eu vejo isso”.

A boa notícia é que dá pra sair desse ciclo. Mas não com fórmulas mágicas, promessas de riqueza em 3 cliques ou mantras motivacionais. Tudo começa com consciência. Saber que o cérebro tem falhas previsíveis — e que o algoritmo sabe exatamente como usá-las contra você — é um o importante.

A Educação Financeira, nesse cenário, funciona como um escudo. Não para transformar você em um fanático das planilhas, mas para dar autonomia às suas escolhas.

Automatizar investimentos, por exemplo, é uma forma inteligente de contornar a impulsividade. Basicamente, quando a decisão já foi programada com lucidez, o “você de agora” não tem chance de sabotar o que o “você racional” já deixou bem resolvido.

Tornar os objetivos mais visuais também funciona. O cérebro leva mais a sério uma meta com nome, data e propósito do que uma ideia vaga de “guardar pra depois”.

E vale, sim, celebrar o processo. Comemorar o fato de ter feito o certo, mesmo que o extrato ainda não impressione. É isso o que sustenta o hábito quando a recompensa ainda está longe. Também vale dificultar o erro: limitar o a estímulos, bloquear atalhos de consumo, como apps de compra no celular, cartões salvos no navegador ou manter o dinheiro longe da conta principal. São pequenas barreiras que servem para proteger você... de você mesmo.

No fim das contas, construir uma vida financeira sólida não tem nada de glamour. É repetir o certo até que ele vire mais fácil do que o errado. Como disse George Ainslie, o autocontrole não é um dom, é uma negociação interna entre quem você é agora e quem ainda quer se tornar.

O futuro não precisa de milagres. Só precisa que o presente pare de atrapalhar.

Evandro Canello k4c

CEO e fundador do Grupo Redesul, ecossistema de marcas que, desde 2009, ajuda pessoas a realizarem sonhos usando o consórcio do jeito certo. Formado em Ciências Contábeis e pós-graduado em Gestão de Investimentos e Educação Financeira.

  @evandrocanello


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