ATENÇÃO: Esta matéria contém depoimentos fortes relacionados a suicídio. 6s4933
Setembro Amarelo é o mês dedicado à prevenção ao suicídio. Esta campanha teve início no Brasil em 2014, e tem como objetivo conscientizar as pessoas sobre o suicídio e evitar o acontecimento.
De acordo com a associação brasileira de psiquiatria, são registrados cerca de 12 mil suicídios no Brasil todos os anos e mais de um milhão em todo mundo. Esta quinta-feira, dia 10, é marcada pelo Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas a campanha ocorre durante o ano todo.
Os números assustam, mas ao mesmo tempo dão a impressão de que o problema está distante do nosso entorno. Por isso, o Oeste Mais entrevistou Izabel Teles, de 20 anos, que fala abertamente sobre a depressão e o doloroso processo que a levou a algumas tentativas de suicídio.
A ponteserradense Izabel, estudante do ensino médio, relata que os primeiros indícios de depressão surgiram aos 14 anos. Segundo a jovem, ela chorava muito, mas não sabia o porquê e de lá para cá os sintomas se agravaram.
“Em 2019 tudo isso mudou. Além de chorar eu tinha muita dor no coração, dor no estômago, náuseas, a alma vazia. Meu peito pedia socorro e eu não sabia do que se tratava. Certo dia eu peguei uma tesoura e me automutilei”, relembra Izabel.
Emocionada, a estudante conta que seu único e doloroso trauma foi ter sido vítima de estupro antes das crises de depressão. Conforme a jovem, a família e amigos perguntavam o que estava acontecendo, até que ela resolveu que não estava bem e tinha pensamentos suicidas.
A partir desta conversa, a família de Izabel arrecadou recursos financeiros e foi em busca de auxílio médico. Nesta época, ela ia todas as semanas a psiquiatras e psicólogos, mas que as dores da alma não amenizavam.
“Comecei a pensar que nada mais na minha vida tinha sentido. Aquela dor, aquela angústia aquela escuridão, não avam. Então cometi minha primeira tentativa de suicídio”.
A jovem relata que após o ocorrido, a família decidiu pela internação. Ela ou 30 dias em uma clínica psiquiátrica e, segundo ela, as coisas estavam melhorando. Mas, depois de 15 dias da alta médica, a estudante tentou o suicídio pela segunda vez. Izabel relata que durante o tratamento ela escrevia como se sentia, numa tentativa de auxiliar as outras pessoas a compreenderem o que ela estava ando.
“Ninguém mede o sofrimento. As circunstâncias pessoais que me deixam pior, o choro e a vontade de matar-se, é tudo. Essa imensa dor, culpa, solidão, vazio por dentro, tento tomar remédios, me machucar. Mas o vazio ainda está aqui, estou tentando fingir que estou feliz para que as pessoas ao meu redor não se preocupem. Não quero machucar ninguém. Nunca senti nada igual ao ponto de não querer fazer nada, nem dormir, nem comer, levantar, nada. Só quero ficar quieta, chorando no meu canto. Meu mundo não tem mais cor, nada mais tem clareza. A sensação pela qual estou ando não está fácil e a cada dia isso aumenta. A coragem de me machucar está aumentando. Por que essa dor e esse imenso vazio não desaparecem? Estou agoniada, sinto-me como se estivesse em uma bolha que está diminuindo e me sufocando aos poucos, me machucando lentamente. Essa bolha é de aço, inquebrável. Sem oxigênio e cheia de pontas agudas, diminuindo e me matando. Cada vez que ela encolhe eu fico com medo, falta oxigênio e eu não consigo sair aí vem o choro e junto com ele a ansiedade, a exaustão de tantas tentativas e nada”, fala a jovem bastante emocionada enquanto relembra um de seus textos.
Izabel conta que atualmente mudou totalmente a rotina, hoje em dia frequenta a academia e faz maquiagens como uma forma de terapia. Ela conta também que se apegou a fé como forma de sair das crises. Segundo a jovem, a família é um grande e para ela e essencial para o tratamento e recuperação.
“Por mais difícil que seja, por mais dolorido que seja, por mais angustiante que seja, não se isole não fique sozinho. Saiba que alguém se importa com você, alguém te ama e você vai sim fazer falta. Não deixe de sonhar e acreditar que as coisas vão melhorar. Há dias melhores, não deixe a sua alma morrer”, finaliza Izabel.
Como abordar um tema tão delicado?
Falar sobre suicídio é a melhor forma de preveni-lo. No entanto, isso nem sempre é feito de forma adequada, por isso, o Portal Oeste Mais entrou em contato com duas psicólogas, Sandra Catapan (CRP 12/01062) que atua na Secretária de Saúde de Ponte Serrada, e Paulinne Langaro, que trabalha no Centro de Referência da Assistência Social (Cras) e na Secretaria Municipal de Educação do mesmo município.
De acordo com a psicóloga Paulinne, setembro é um mês para que o suicídio seja desmistificado, seja um assunto abertamente falado. De uma forma que as pessoas tenham o a informação, para que elas saibam como agir ou saibam como procurar ajuda profissional.
Existem fatores protetivos que reduzem o risco de suicídio e fornecem e e proteção, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). A psicóloga Sandra comenta que, apesar destes fatores não eliminarem totalmente os riscos, eles ajudam em momentos difíceis. Segundo ela, vale destacar:
? apoio da família, de amigos e de outros relacionamentos significativos;
? crenças religiosas, culturais e étnicas;
? envolvimento na comunidade;
? vida social satisfatória;
? integração social, por meio do trabalho e do uso construtivo do tempo de lazer, por exemplo;
? o aos serviços e cuidados de saúde mental.
Sandra explica ainda que, de acordo com a OMS, os sentimentos de um sujeito suicida são de desesperança, desamparo e desespero. E os principais fatores de risco são os transtornos mentais, incluindo abuso de álcool e outras drogas e histórico de tentativa de suicídio.
“Se pode considerar como frases de alerta: ‘eu preferia estar morto’; ‘eu não posso fazer nada’; ‘eu não aguento mais’; ‘eu sou um perdedor e um peso pros outros’; ‘os outros vão ser mais felizes sem mim’”, explica a psicóloga da Secretaria de Saúde.
Paulinne lembra que sobre o sujeito suicida não há um diagnóstico exato, não tem uma forma exata para que isso ocorra.
“Muitas vezes os sinais não são perceptíveis. As famílias levam por surpresa quando descobrem que o seu familiar está sofrendo por ter como possibilidade o suicídio. A gente não tem uma receita, não tem uma forma exata de diagnosticar. Precisamos prestar atenção quando aparecem problemas de condutas diferentes, de personalidade, de manifestações verbais sobre isso, falas angustiantes, quando a pessoa tem picos entre ansiedade, depressão, choro e relata sobre isso. Também quando a pessoa tem falta de esperança no futuro, quando a pessoa fala sobre a própria morte de uma forma sem esperança”, reforça a psicóloga do Cras.
Conforme Paulinne, as pessoas verbalizam que vão tirar a própria vida, não é uma forma de chantagem emocional, é uma demonstração do sofrimento pelo qual a pessoa está ando.
“Existe um ditado que diz que pessoas que falam que vão se matar não vão se matar. Mas isso é um ditado popular, e sim a gente deve dar atenção para isso, deve oferecer ajuda, e fazer o que a gente puder para auxiliar essa pessoa nesse momento de sofrimento”, comenta a profissional de saúde do Cras.
Segundo Sandra Catapan, a pessoa que está em sofrimento pode procurar ajuda através do Centro de Valorização da Vida (CVV) através do telefone 188, a ligação é gratuita e pode ser feita de forma anônima. A pessoa também pode buscar ajuda no Sistema Único de Saúde (SUS), no Cras e no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). A pessoa também pode procurar ajuda através do site www.setembroamarelo.com.
“Em nosso município [Ponte Serrada] os casos que chegam, sempre são encaminhados aos serviços como Cras, ou mesmo ao serviço de psicologia e da assistência social da Secretaria de Saúde, que os encaminha ao psiquiatra ou se necessário são encaminhados para internação”, explica Sandra.
Sandra relata ainda que a melhor forma de abordar o assunto é não julgando a pessoa e falando de forma calma, aberta e através da aceitação. Também é importante observar as atitudes do familiar em sofrimento e, se necessário procurar ajuda especializada.
A psicóloga Paulinne Langaro reforça que se o familiar perceber que a pessoa em sofrimento está em perigo eminente ela não deve ser deixada sozinha. É importante buscar ajuda de profissionais de saúde, emergência ou até mesmo entrar em contato com alguém de confiança da pessoa que está sofrendo.
“Se a pessoa está sofrendo, está ando por este momento difícil, com comportamentos suicidas ou mesmo com a depressão profunda e transtornos de ansiedade, essa pessoa tem os motivos dela para estar vivendo desta forma, para estar sentindo isso. Não cabe a nós julgarmos. O julgamento não ajuda, essa pessoa está em extremo sofrimento, para ela isso só vai trazer mais culpa de não estar vivendo da forma que os outros acham que ela deveria viver. Também não é adequado dizer que sabe pelo o que a pessoa está ando porque o que ela está vivendo é uma dor unicamente dela. Por isso, entre outras coisas, a gente deve principalmente não julgar, tentar entender, tentar compreender e dar apoio” finaliza Paulinne.
Apoio às famílias que perderam um ente querido
Perder alguém que se ama não é fácil, perder alguém que se ama por suicídio, certamente é um acontecimento que não será apagado. Muitas vezes, os familiares precisam de ajuda profissional para compreender e aceitar este tipo de morte.
De acordo com a psicóloga Sandra Catapan, o luto por suicídio é diferente de outras formas de luto. Além disso, o luto pode levar um tempo variado e ser muito diferente para cada pessoa, embora haja muita dor, cada ser humano reage de formas variadas a ela. A experiência das pessoas em luto é muito individual.
“São emoções comuns experimentadas a negação, o choque, a raiva, a vergonha, o desespero, a culpa, a tristeza, a solidão, a impotência, a ansiedade, a sensação de estar anestesiado e dificuldade de acreditar que o suicídio realmente aconteceu. Reconhecer e expressar suas emoções, é o primeiro o para lidar com elas”, comenta a psicóloga.
Sandra ressalta que é muito importante que se evite a busca por culpados e que sempre seja lembrado que não se pode controlar tudo na vida de outra pessoa.
No município de Ponte Serrada não há um trabalho específicos para familiares que perderam alguém por suicídio, mas são ofertados acompanhamentos psicológicos e psiquiátricos a quem precisar e quiser, de acordo com Sandra. Há também uma cartilha informativa de apoio a estes familiares, do Centro de Educação em Prevenção e Posvenção do Suicídio, disponível nas unidades de saúde.
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